"Nevermind", reprodução da capaPor Demétrius Carvalho*

24 de setembro de 1991 é lançado o disco “Nevermind”, do Nirvana, talvez o último grande de uma banda de rock. Álbum esse que é um dos mais emblemáticos do gênero de todos os tempos e por vários aspectos. O disco, que completa 25 anos em 2016, pode se encontrar na prateleira de rock, punk, embora seja bem diferente dos outros encontrados e, obviamente, na de grunge, onde eles se tornaram um dos pais do gênero.

Esse é o segundo álbum da banda de Kurt Cobain e do baixista Krist Novoselic e o primeiro com o baterista Dave Grohl. O disco não inspirava grandes expectativas de venda, mas apenas 14 dias antes, “Smells Like Teen Spirit” era lançada como single e causou um estrondo que apenas começava para o trio.

Novoselic disse certa vez que a entrada no novo baterista parece ter colocado as coisas no lugar. Somado a isso, o momento contou com os improváveis caminhos harmônicos e melódicos de Kurt e a produção de Butch Vig, que disse ter pensado em uma mixagem para a nova música digital que surgia e não de forma analógica como feita até então.

Kurt não tinha estudo musical e chegou e declarar que a teoria era uma besteira. Grohl disse que o vocalista pensava primeiro nas melodias para depois pensar na letra.

O disco abre com a excelente “Smells Like Teen Spirit” e ela sintetiza tudo o que temos nesse trabalho do Nirvana. Uma composição excelente com melodia acima do gênero proposto, caminhos harmônicos diferente, mas de fácil absorção pelos ouvidos, além de muita energia alternando extremos de dinâmicas.

O solo de guitarra praticamente refaz a melodia e caminha de lado oposto aos guitar heros da época. Nesse aspecto, ele se aproxima do chamado punk “make yourself“.

O disco segue com “In Bloom”, que escancara ainda mais as guitarras cruas, trabalho de dinâmica que inclui inclusive momentos nos quais a guitarra não toca ou solos de guitarra muito mais preocupados com ambiência do que melodias ou virtuosismo.

Em seguida, temos “Come as You Are”. Outra música indispensável na discografia da banda. O mesmo power trio presente em todo o disco (baixo, bateria e guitarra) conta apenas com overdub de guitarra (guitarras adicionais acrescentadas), assim como a inclusão de vocais, mantendo até então uma coesão de sonoridade do disco.

“Breed” se apresenta em seguida como uma das mais punks canções do disco sobre vários aspectos, mas impressionantemente consegue chegar em uma parte B da música como uma melodia super interessante com uma pequena ponte para retornar ao clima caótico do começo da música. Quando tudo se repete, temos um solo de guitarra completamente fora do convencional que prepara para a volta da parte B da música e para ela se encerrar.

“Lithium” começa com guitarra e baixo por um improvável caminho harmônico. A bateria e melodia também por caminhos e resoluções não esperadas surgem na segunda rodada da harmonia para desembocar em um refrão mais vigoroso e que vai pregar nos seus ouvidos por ter utilizados os mesmos caminhos de até então acrescidos apenas da distorção e da levada da bateria. Ao melhor estilo de música pop, a forma se repete mas ao final da segunda vez, surge uma parte c com outra melodia impregnante.

“Polly”, talvez, seja diferente das outras canções por ter sido gravada a primeira parte praticamente com violão. Um baixo entra mais a frente. Na terceira estrofe, apenas o baixo começa, dando uma mudança de clima, mas a letra titubeia ao entrar. Teria sido um esquecimento momentâneo para retomada logo em seguida do qual resolveram deixar? A questão é que ela da um respiro interessante à dinâmica da música.

A sétima música é “Territorial Pissings”, uma das mais viscerais do disco – e visceral no sentido de berrada e jogada para fora. No final da música, Kurt está literalmente berrando. E vale uma ressalva para as canções do grupo: Kurt não gostava de emendas nas canções. Caso não ficasse satisfeito, cantaria tudo novamente.

“Drain You” é uma música que inclusive parece com muita coisa que ouvimos hoje do indie rock, mas, ela estava sendo lançada ali no ano de 1991. Os caminhos melódicos de Kurt permanecem sempre presentes até que a duração de 1’35”, inesperadamente (e eles tinham a capacidade de surpreender), entra um clima soturno do qual você não sabe onde vai desaguar e, inacreditavelmente, e por incrível que pareça, de uma forma natural, ela leva a mais uma estrofe.

“Lounge Act” parece repetir alguns caminhos do Nirvana, mas dessa vez é o baixo que conduz a música só em um primeiro momento para que a banda inteira se faça presente. A canção se desenvolve e se repete como normalmente acontece na música. Na terceira estrofe, em que supostamente repetiria a música, Kurt canta uma oitava acima aos já tradicionais berros.

Vale a ressalva que músicos e produtores costumam encontrar formas de diferenciar uma parte da outra com o acréscimo de um efeito aqui, um teclado ali. Mas a banda continua desenvolvendo suas resoluções apenas entre eles.

Temos então “Stay Away”. É outra que parece levar seus vocais ao extremo e que termina de uma forma em que a composição entra em decomposição (e a intenção não foi a de um trocadilho).

Depois disso, “On a Plain” começa com umas microfonias e notas que parecem anteceder um estouro sonoro e entra uma surpreendente melodia (incluindo arranjos vocais no refrão) que mostra que a primeira impressão estava errada. A conclusão da música por sinal é com os tais vocais.

Oficialmente encerra-se o disco com “Something in the Way”, a mais soturna das músicas do trio, mas de uma beleza com direito a arranjo de cordas e sempre citada por fãs da banda. Essa canção se encerrava e tinha-se então dez minutos de silêncio até que uma música escondida se revela. No disco ela não é citada e depois passou a ser conhecida como “Endless, Nameless” . Essa é puro ruído e de uma letra para espantar todos os espíritos.

“Nevermind” é um disco que é impossível passar despercebido por sua audição. Você pode até não gostar, mas que ele vai estar na lista dos maiores discos de rock de todos os tempos pelo resto de sua vida, vai.

Dave Grohl era um excelente músico que de certa forma destoava dos outros dois, mas Kurt unindo suas composições aos dois outros integrantes, conseguiu uma coisa de extrema importância na música: identidade sonora.

Para comemorar os 25 anos do álbum do Nirvana, o Roque Reverso descolou os clipes oficiais de algumas das faixas no YouTube. Fique inicialmente com o de “Smells Like Teen Spirit”. Na sequência, veja os vídeos de  “In Bloom”, “Come as You Are” e “Breed”. Para fechar, fique com o clipe de “Lithium”.

*Demétrius Carvalho é músico, baixista do Jazza Roll e amante do bom e velho rock n’ roll