O Metallica voltou depois de quatro anos a São Paulo e realizou um grande show no dia 22 de março no Estádio do Morumbi. Para um púbico de 65 mil pessoas, a banda norte-americana de thrash metal superou com peso, técnica e qualidade uma chuva fina e insistente que caiu durante praticamente toda a apresentação, marcada também pela ausência dos tradicionais efeitos pirotécnicos que costumam ser vistos nas performances do grupo.

Como havia prometido, o Metallica trouxe para a capital paulista o show inovador que é marcado por um novo conceito, no qual o fã escolhe o set list executado. Foram 17 músicas eleitas pelo público, além da canção nova “Lords of Summer”.

Esta última foi apresentada pela primeira vez em Bogotá, na Colômbia, no dia 16 de março, no início da turnê que trouxe a banda à América do Sul.

Apesar das críticas dos fãs mais antigos pela escolha de um set list com poucas novidades em relação ao que o grupo já havia tocado em shows brasileiros, a configuração do repertório, com várias sequências de músicas de um mesmo disco agradou bastante. Além disso, a vontade demonstrada pela banda e acima de tudo a qualidade técnica impecável dos músicos fizeram muita gente deixar a polêmica de lado.

Após uma abertura bastante fraca realizada pelo grupo britânico Raven, o Metallica subiu ao palco com 50 minutos de atraso, algo pouco comum nas vindas da banda por aqui. A poucos minutos do início da apresentação do grupo dos EUA, uma chuva fina que não havia caído em momento algum do dia em São Paulo começou a molhar o Estádio do Morumbi, como se São Pedro deixasse claro que não gostava de heavy metal.

Todo fã que conhece o mínimo da história do Metallica sabe que a banda utiliza há anos a tradicional introdução de “The Ecstasy of Gold”, de Ennio Moricone, acompanhada de imagens no telão do filme “Três Homens em Conflito”, de Sérgio Leone. A novidade em 2014 é que o grupo trouxe antes um pequeno trecho filmado bem humorado que mostrava a banda lendo os pedidos e comentários dos fãs nas redes sociais “metallicas” com as ideias mais malucas possíveis. O público ria a cada citação absurda e a ideia agradou em cheio.

Terminada a introdução de “The Ecstasy of Gold”, os músicos apareceram no palco com uma das aberturas mais pesadas dos últimos tempos. Pela primeira vez em shows no Brasil, o Metallica começou um show com a música “Battery”, que abre seu disco mais aclamado por crítica e público: “Master of Puppets”. Como se estivessem em sintonia única, fãs da Arquibancada, Pista Comum, Pista Vip e Cadeiras do Morumbi elevaram o som do estádio a um nível ensurdecedor e empolgante.

Sem deixar a peteca cair, o Metallica emendou nada menos que “Master of Puppets”, a mais votada entre as faixas escolhidas para São Paulo. A energia continuou em alta e a chuva, que não parava de cair, já nem era percebida por muitos, que se encharcavam com felicidade. Para completar a trinca do álbum, foi a vez da execução da ótima “Welcome Home (Sanitarium)”, que trouxe o vocalista e guitarrista James Hetfield na parte superior do palco com sua inconfundível ESP branca.

O fã mais atento deve ter notado que o fato de o Metallica tocar três músicas seguidas do “Master of Puppets” foi um momento histórico para os brasileiros, já que isso nunca havia acontecido por aqui. Se havia alguém que tivesse torcido o nariz para a votação das músicas, esses três petardos consecutivos serviram como se fossem um antídoto.

Depois da trinca histórica, Hetfield conversou com o público e lembrou que fazia quatro anos que a banda não tocava na capital paulista. Durante sua saudação ao público, uma labareda surgiu do nada muito próxima do guitarrista, que tomou um susto, assim como o público que estava ali perto. Nesse momento, foi fácil notar ele pedindo para os técnicos desligarem algo, possivelmente o sistema especial de pirotecnia que o Metallica usa há anos da maneira mais profissional e qualificada possível.

Quem conhece a banda, sabe que o vocalista já teve experiências bastante desagradáveis com fogo na década de 90, quando queimou os dois braços num acidente com efeitos pirotécnicos no palco durante um show. Não por acaso, depois disso, o Metallica montou uma equipe técnica justamente para isso elogiadíssima no assunto.

O fato é que, depois da labareda no palco do Morumbi, a primeira ausência pirotécnica notada foi notada logo na música seguinte. Na pesada e vibrante “Fuel”, não foi visto o tradicional espetáculo com fogo que é dado na metade da execução da faixa. Não que isso tenha atrapalhado o show, mas era algo que os fãs que estiveram no mesmo Morumbi, no segundo show de 2010, e, no Rock in Rio de 2011, já haviam se acostumado.

Na sequência, foi a vez da primeira música da noite do “Black Album”. A belíssima “The Unforgiven” começou a ser dedilhada por James Hetfield e emocionou a todos. Para quem já viu a música ser tocada ao vivo, a execução no Morumbi ficou a desejar e, talvez, tenha sido o ponto fraco da apresentação. Com um timbre um pouco diferente do normal, o violão de James parecia travar um pouco a já complexa canção e até a forma como ele cantou naquele momento ficou estranha.

A compensação de “The Unforgiven” viria logo em seguida e em forma de música nova. Com mais de 8 minutos de duração, “Lords of Summer” agradou em cheio, tanto por ter várias mudanças em sua levada como por ser bastante pesada. Destaque para a performance do baterista Lars Ulrich, que vinha há anos sendo criticado pelos fãs mais exigentes pelo modo um pouco mais “preguiçoso” como estava tocando o instrumento e que, no Morumbi, foi certamente um dos melhores da noite. Nesta canção, por sinal, a banda toda deu a impressão de altíssimo entrosamento.

Importante lembrar que o Metallica, além da votação do set list pela internet e da música nova, tinha uma outra novidade nos shows da turnê: o público foi liberado a escolher, via SMS, uma última faixa para o show, que foi votada durante a apresentação. O set list manteve as 18 músicas prometidas, mas houve a abertura de uma eleição entre as canções que ficaram da décima sétima posição para baixo, uma espécie de “repescagem” entre as faixas que ficaram até décima nona posição.

Em São Paulo, o clássico “Ride The Lightning” era exatamente a décima sétima canção da lista. “The Day That Never Comes” era a décima oitava. “Memories Remains” era a décima nona.

Durante vários momentos do show, James Hetfield lembrou da votação por SMS que, desde o início, teve “The Day That Never Comes” em primeiro, seguida muito de perto por “Ride The Lightning”. “Memories Remains” surpreendeu, pois apesar de ser a mais pop delas, teve uma votação pífia.

Em todas as vezes que James lembrava da votação, o público vaiava “The Day That Never Comes” e vibrava com “Ride The Lightning”. O fato é este jornalista que vos escreve tentou votar inúmeras vezes por SMS, mas a mensagem sempre apresentou falhas. Ou seja, isso pode ter acontecido com outras pessoas e até ter determinado a votação.

Depois de “Lords of Summer”, o Metallica retomou o show de hits e emendou “Wherever I May Roam”. Mantendo a tradição da maioria de suas apresentações, a banda tocou esta com perfeição e voltou a levantar o público, que vibraria também com o clássico “Sad But True”, apresentado por um fã que fazia parte do grupo de membros do fã clube oficial do quarteto norte-americano.

Na sequência, “Fade to Black”, do segundo álbum da banda “Ride The Lightning”, cumpriu seu papel de emocionar os fãs com os belos acordes de James e Kirk Hammett. Depois dela, destaque para a execução da ótima “…And Justice For All”, que havia sido tocada no Rock in Rio de 2013, mas que não aparecia em São Paulo desde 1989, na primeira passagem do Metallica pelo Brasil.

O show já estava na sua metade final quando a introdução matadora de “One” foi ouvida no Morumbi. Certamente, neste momento da apresentação, os fãs sentiram uma enorme falta da parte pirotécnica. Não que a banda não tenha tocado com maestria mais este clássico, mas as explosões tradicionais que acompanham a música fizeram muita falta.

Em “For Whom the Bell Tolls”, o estádio viu mais um grande momento do Metallica em todo o show. Com a incrível performance de Robert Trujilo no baixo, a canção foi tocada com vibração, técnica e muita qualidade por todos, que mandaram, na sequência,a execução da não menos obrigatória “Creeping Death”. Ela fez o Morumbi inteiro gritar, depois de ser anunciada por mais um dos fãs convidados presente na lateral do palco.

A lista de  hits era imensa e foi com mais dois do Metallica que a primeira parte do show foi encerrada. Em “Nothing Else Matters”, o público viu uma bela introdução de Kirk Hammett na guitarra e uma técnica e um entrosamento espetacular da banda. Em “Enter Sandman”, uma verdadeira catarse coletiva foi vista no estádio.

Na volta para o bis, uma fã anunciou “Whiskey In The Jar”, que foi tocada pela primeira vez no Brasil em toda a história. Ela foi muito bem executada, mas pareceu deslocada perto dos demais clássicos do Metallica.

Depois dela, o grupo finalmente tocou a música da “repescagem” promovida via SMS. “The Day That Never Comes” bateu “Ride The Lightning”. Quando o telão mostrou a vencedora, o Estádio do Morumbi ouviu várias vaias, que deixaram James Hetfield surpreso. “Mas foram vocês que votaram!”, disse.

Quando a banda tocou a música, porém, a reação foi super positiva e, mais uma vez, o Morumbi viu todos os fãs cantando a canção, que foi a única do disco “Death Magnetic” executada. Restou uma esperança de uma surpresa com “Ride the Lightning”, mas a banda cumpriu o cronograma estipulado.

A última música do show foi a manjadíssima e obrigatória “Seek & Destroy”. Ela foi tocada com as luzes do estádio acesas e com o Metallica lançando enormes bolas pretas para alegrar o público. No final, James, Lars, Kirk e Trujilo ainda ficaram um bom tempo agradecendo o público e distribuindo uma farta quantidade de palhetas e baquetas.

Na visão deste jornalista, o show de 2014 foi um dos melhores já feitos pelo Metallica no País, mas não foi o maior de todos. Esta marca fica ainda com a primeira apresentação que a banda fez no Rock in Rio, em 2011. Mesmo em São Paulo, o show da primeira noite de 2010, na opinião de quem vos escreve, foi também ligeiramente melhor. Para os fãs mais antigos, porém, as apresentações de 1989, apesar do período que marcava a banda ainda fora do mainstream, são algo que jamais sairá da memória dos que foram.

Para relembrar o grande show do Metallica em São Paulo, o Roque Reverso descolou vídeos no YouTube. Para começar, veja a abertura com “Battery”. Depois, assista à exibição da nova música “Lords of Summer”. Na sequência, veja o vídeo de “…And Justice For All”, a produção própria nossa de “One”, um vídeo descolado de “For Whom the Bell Tolls”, outra produção nossa com “Nothing Else Matters” e, para fechar, “Seek & Destroy”.

Set list

Battery
Master of Puppets
Welcome Home (Sanitarium)
Fuel
The Unforgiven
Lords of Summer
Wherever I May Roam
Sad But True
Fade to Black
…And Justice for All
One
For Whom the Bell Tolls
Creeping Death
Nothing Else Matters
Enter Sandman

Whiskey In The Jar
The Day That Never Comes
Seek & Destroy