Muito já deve ter sido dito durante este 11 de outubro de 2016, quando foram completados 20 anos da morte de Renato Russo. Um sentimento, porém, deve ser praticamente unânime: a falta que a voz e a mente do eterno vocalista do grupo Legião Urbana fazem nos tempos atuais de trevas do Brasil.
Depois de um processo traumático de impeachment de uma presidente fraca politicamente promovido por um parlamento afundado em acusações e processos diversos de corrupção e outros delitos – tudo isso amparado por uma maioria conservadora da população manipulada sobretudo por uma emissora de televisão que tem contas a acertar com a história -, o País se depara com um colossal retrocesso em praticamente todas as áreas.
Renato Russo, pensador muito à frente de seu tempo, já criticava, nos Anos 80 e 90, o surgimento de grupos conservadores que, pouco depois da volta da democracia no País, pediam a volta do militarismo.
Dentro do rock, não poupava, por exemplo, os skinheads, taxando-os de “babaquinhas”, “sexistas”, “intolerantes” e “idiotas”, conforme vídeos que até hoje podem ser vistos na internet.
Em suas letras, Renato Russo sempre criticou os atrasos e absurdos de um País que, pelo menos até a metade dos Anos 90, tinha como motivos maiores de orgulho internacional o futebol e o samba. Morto em 1996, ele chegou a pegar algum período de mudanças, especialmente na área econômica, nos governos Itamar Franco e Fernando Henrique Cardozo, mas perdeu totalmente os ganhos sociais que foram vistos durante o governo Luiz Inácio Lula da Silva e que fizeram o Brasil ser motivo de outras manchetes positivas além da música e do esporte.
“Que País É Este”, música do Legião Urbana tocada em várias campanhas e protestos reacionários, deixaria Renato Russo completamente transtornado, se ele olhasse alguma manifestação popular, por exemplo, em frente à Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), mesma entidade que apoiou o golpe militar de 1964 que ele tanto achava repugnante.
“Veraneio Vascaína”, que foi sucesso com o Capital Inicial, mas que tem Renato Russo entre os compositores, está mais atual do que nunca, dada a postura truculenta das polícias militares brasileiras e dada a inacreditável notícia recente de absolvição dos policias que massacraram 111 detentos do Carandiru em 1992.
“Vamos celebrar a estupidez humana/A estupidez de todas as nações/O meu país e sua corja de assassinos/
Covardes, estupradores e ladrões/Vamos celebrar a estupidez do povo/Nossa polícia e televisão/Vamos celebrar nosso governo/E nosso Estado, que não é nação/Celebrar a juventude sem escola/As crianças mortas/Celebrar nossa desunião.”
Estes versos iniciais de “Perfeição”, do Legião Urbana, também parece cair como uma luva, assim como “Teatro dos Vampiros”: “Vamos sair/Mas não temos mais dinheiro/Os meus amigos todos estão/Procurando emprego/Voltamos a viver/Como há dez anos atrás/E a cada hora que passa envelhecemos dez semanas.”
Muitos podem levantar a dúvida se Renato, mais velho, poderia ter se transformado em rockeiro reaça, como alguns conhecidos atualmente que deixaram a mente ficar mais antiga do que o próprio corpo. Mas, contestador e representante de minorias, como sempre foi, o músico dificilmente embarcaria no momento conservador que não é exclusividade do Brasil.
Poderiam também levantar a hipótese de Renato Russo ser tachado de “petralha”, “mortadela”, “comunista” ou aproveitador da Lei Rouanet, como até Chico Buarque chegou a ser acusado, em função das suas crenças políticas.
Se, na década de 80, o mundo tinha Ronald Reagan e Margaret Thatcher, neste período do Século XXI tem uma ameaça chamada Donald Trump e outros nomes espalhados na Europa e em outros continentes.
O fato é que Renato Russo faz falta não apenas para o combalido rock brasileiro como para seu próprio País. Sem sua presença, resta aos fãs e demais brasileiros atentos ao atual momento recorrerem às letras e músicas do Legião Urbana para amenizar suas perdas.
Para relembrar esta grande figura da música brasileira, o Roque Reverso descolou vídeos com a marca do músico e letrista. Fique inicialmente com o clipe oficial de “Que País É Esse”. Depois fique com o Capital Inicial em clipe gravado mais recentemente para “Veraneio Vascaína”. Na sequência, fique com os clipes de “Perfeição”, “Teatro dos Vampiros” e o hino de uma geração: “Tempo Perdido”.
Texto escrito com alma, por quem ainda tem a capacidade de se indignar! Mandou bem, Flavio!
Seria muito bom ouvir o que Renato Russo teria a dizer dos dias de hoje na Terrinha! Assim como seria incrível escutar o que Lennon diria sobre o mundo de hoje se estivesse vivo.
Gênios desse nível fazem – e sempre farão – muita falta!
Obrigado, Roberto!!!
Realmente seria interessante ver o que os dois teriam a dizer.
Se bem que já temos alguma noção de como seria…
Flavitcho, você matou a pau no texto, no melhor estilo Roque Reverso.
Beto, eu considero caras como o Renato Russo e o John Lennon membros honorários do “clube dos 27”, aquele tipo de gênio que se vai cedo demais por estar tão à frente do tempo que em algum momento a incompreensão do público em geral se transformaria em resistência ao legado.
A respeito do Renato Russo, recomendo a leitura de “A Juventude e o Brasil de Renato Russo”, de Tatiana Tavares: http://www.arvoredigitaleditora.com.br/produto/renato_russo/
😉
Obrigado, meu caro!
Foi feito meio que na correria nossa de cada dia, mas acho que valeu a pena!
Aqui neste vídeo do YouTube, uma entrevista de Renato Russo com muito do que está neste texto: