Por Marcelo Galli
Alguém teria dito que o Brasil ficou surdo para a música feita por bandas e músicos dos países vizinhos porque a riqueza musical interna bastava. Deve ter sido algum argentino integrado, tipo Fito Paez, quem fez essa análise. Não precisa ser gênio para chegar à mesma conclusão, e concordo com ele. E, aqui o pesar é todo meu, ruim que seja dessa maneira. Enquanto a fina flor da Música Popular Brasileira está ‘allá’, também a Xuxa e os Paralamas do Sucesso, azar para os que não conhecem Luis Alberto Spinetta, por exemplo, sem dúvida o principal nome do rock argentino, ou nacional, como eles costumam nomear.
São dele algumas das músicas mais bacanas que escutei nos últimos dois anos. Spinetta nasceu na desde sempre nostálgica Buenos Aires, em 23 de janeiro de 1950, no bairro de Belgrano. Gravou mais de duas dúzias de discos, teve mais de uma dúzia de bandas e projetos, entre eles Almendra, Pescado Rabioso, Invisible e Spinetta y los Socios del Desierto. Autodidata, conseguiu criar seu próprio estilo.
Além de tocar muito guitarra, uma Fender, é um compositor inteligente, melodioso, complexo alguma vezes, mas em outras se sai com um riff chiclete (daqueles bons, que não desmancham na boca) como em “Habladurías del mundo”, do Artaud, de 1973. Profundo em suas letras, tem de tudo, de Rimbaud, Nietzsche, Foucault à psicanálise, aos temas locais cujo mote é a viagem pelo país, como em “Rutas Argentinas” e “Toma El Tren Hacia El Sur”, do segundo do Almendra, de 1970. Spinetta reúne qualidades difíceis de encontrar em um músico roqueiro. A palavra está batida faz tempo, eu já até devo ter usado nesse texto, mas o cara é gênio.
É Beatles, é Zeppelin, é Hendrix, é rock, progressivo, psicodélico, hard, é blues (o pai dele foi um cantor amador, Spinetta passou a infância escutando tangos, experiência que deve ter deixado o blues dele mais blues), a fonte está na cara, mas as canções não soam como cópia de exemplos anglo-saxões, há algo autóctone. Escute “Barro, tal vez”, do disco “Kamikaze”, de 1982, na interpretação de Mercedes Sosa, e vai compreender o que quero dizer.
Para se ter ideia da importância do “El flaco” (o magro), na lista feita há quatro anos pela revista Rolling Stones local dos 100 discos mais importantes da música argentina, ele é responsável por dois. No topo do ranking aparece Artaud, com o Pescado Rabioso, mas é praticamente um disco solo, feito com músicos convidados e velhos amigos; e no sexto lugar, Almendra, de 1969, que tem a irresistível balada “Muchacha Ojos de Papel”. O segundo melhor disco é do ex-integrante da Sui Generis, Charly García, com “Clics modernos”, de 1983. Spinetta e ele gravariam um disco juntos em 1985, mas só foi registrada uma canção em parceria (“Rezo por vos”). O Lulu Santos, no “Liga lá”, gravou uma música de García.
São raros os trabalhos dos hermanos que permeiam a fronteira. Em BsAs, no ano passado, escutei um monte de coisa bacana, diversa, em diferentes lugares e pensei “por que raios a gente não ouve isso nem em SP?” Confesso que tb não fui atrás, despues.
E viva a diversidade do blog, meninos. 🙂
Valeu, Ana!
O blog tenta trazer algumas coisas boas. O Marcelão deu a ideia e ela foi totalmente aceita!
Bjs
E tem mais. Alguns músicos argentinos ajudaram bastante a música brasileira, principalmente na Tropicália e o rock feito depois. Vou tentar contar a hitória em um outro texto.
As portas estarão sempre abertas, Marcelão!
Muito obrigado novamente!
Abraço!
E não se acha absolutamente nada de Spinetta ou Charly Garcia por aqui. Tem uma parceria dos dois, “Peluca Telefonica”, no CD Inconsciente Coletivo, do Charly, que conta também com o Pedro Aznar. Este eu vi tocar em São Paulo há alguns anos, mas já não era pegada roqueira. Acho que todo mundo já viu ou ouviu falar das loucuras do Charly Garcia. Mas nada supera esta, que sei lá por que, só pode ser vista via login no YouTube:
http://www.youtube.com/verify_age?next_url=http%3A//www.youtube.com/watch%3Fv%3D_ilON6GPFJE